Resenha do
livro “FERNÃO CAPELO GAIVOTA”, de Richard Bach
Li esse livro pela primeira vez aos 12 ou 13 anos. Antes já havia lido “Ilusões”, que Richard Bach escreveu depois de “Fernão Capelo Gaivota”. Dessas duas leituras ficou a impressão de um autor que falava sobre “algo mais” em suas histórias, que por conta disso traziam algo de mágico e misterioso para o leitor.
Aos 15 anos li de novo, dessa vez para a escola. Li para fazer uma prova no 2º ano do 2º grau do Colégio Marista São José, no Rio de Janeiro. A professora ter escolhido esse livro me surpreendeu por dois motivos. Primeiro, pelo livro não ser de autor de língua portuguesa. Segundo, por considerar o tema do livro um tanto esotérico demais para uma escola de padres. Olhando em retrospecto agora, acho que o motivo para essa escolha deve ter sido o filme que foi feito do livro (https://youtu.be/oCzCIRhFUMw), cuja exibição a professora organizou para as turmas daquele ano. Acho que foi só nessa exibição que atentei para o título original da obra, “Jonathan Livingston Seagull”, que foi tão criativamente traduzido como “Fernão Capelo Gaivota”!
Dali a uma
semana fizemos a prova sobre o livro, ocasião em que testemunhei uma cena
assombrosa: um colega chamado Giovanni, ao término do teste, segurou o seu
exemplar de “Fernão Capelo Gaivota” entre as mãos fortes de atleta e de um
golpe só rasgou o livro ao meio. Sobretudo a expressão no rosto dele ao destruir
o livro foi o que me marcou. Até hoje, tantos anos depois, fico imaginando o
que nesse livro incomodou tanto o meu colega a ponto de levá-lo a um ato tão
dramático de vingança.
Por algum motivo sempre ligo essa lembrança a uma outra questão intrigante: o que levou Stephen King a publicar diversos livros sob o pseudônimo de Richard Bachman? O primeiro desses livros foi “Rage”, publicado em 1977, sete anos depois de “Jonathan Livingston Seagull” ter se tornado um fenômeno de vendas nos Estados Unidos, com mais de um milhão de cópias vendidas só na base do boca a boca. Sem contar que 1977 foi o ano do lançamento do segundo livro mais famoso de Richard Bach: “Ilusões: as aventuras de um messias indeciso”. Digo isso porque sempre tive como certo que Stephen King escolheu o pseudônimo de Richard Bachman como algum tipo de brincadeira ou ironia com o seu quase homônimo Richard Bach. Mas ao pesquisar sobre o assunto hoje descobri um artigo explicando que King escolheu esse nome para homenagear Richard Stark (pseudônimo adotado pelo escritor de livros policiais Donald E. Westlake) e a banda de rock Bachman-Turner Overdrive. O próprio King escreveu um texto contando essa história, e ele jamais menciona o nome de Richard Bach. Essa omissão me intriga. É como se o Rubem Fonseca tivesse lançado uns livros sob o nome de Paulo Coelhomem, e a escolha desse nome não tivesse nada a ver com o Paulo Coelho.
Pois então. Hoje, mais de trinta anos depois, li “Fernão Capelo Gaivota” pela terceira vez. Gostei muito, mas não tanto como imaginei que iria gostar. Penso que o livro pode ter ficado um pouco datado, o que se evidencia nas fotos que ilustram o texto. Lembro que essa edição recheada de fotos de gaivotas e do mar me encheram de deleite, lá pelos meados da década de 1980, mas visto sob um olhar de hoje, com tanta tecnologia envolvendo o tratamento (e até a criação) de imagens, essas belas fotos de Russell Munson parecem pouco nítidas, com montagens simplistas. E talvez o texto tenha ficado também com esse sabor “vintage”, pois certamente “Fernão Capelo Gaivota” é uma história que reflete admiravelmente o zeitgeist [espírito da época] dos anos setenta.
Nessa terceira leitura, o ponto mais luminoso foi a surpreendente ponte com a maravilhosa saga de “Musashi”, de Eiji Yoshikawa. Ao contar a história do maior samurai do Japão, Yoshikawa tece uma linda alegoria sobre o Caminho da Espada: buscar a perfeição na arte da esgrima equivale a buscar a perfeição espiritual. Ou seja, quanto mais hábil for em cortar a carne e os ossos dos adversários com espadas afiadas, mais próximo está o sujeito de alcançar a iluminação e de se tornar um com o Um. Essa ideia paradoxal aparece também, de forma bem mais suavizada, na busca de Fernão Capelo Gaivota pela perfeição no voo.
Esse tema me fascina e tem me levado a muitas reflexões. Há algum tempo cheguei a escrever um artigo propondo essa jornada espiritual em busca do aprimoramento pela via da literatura. Chamei esse processo de “O Caminho da Pena”. Para minha alegria, o artigo foi publicado em 2019 pela Mundo Escrito (https://mundoescrito.com.br/caminho-da-pena/).
Resumindo: “Fernão Capelo Gaivota” é um livro maravilhoso, que merece ser lido ao menos três vezes.
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FABIO SHIVA é músico, escritor e produtor cultural. Autor de
“Favela Gótica” (https://www.verlidelas.com/product-page/favela-g%C3%B3tica),
“Diário de um Imago” (https://www.amazon.com.br/dp/B07Z5CBTQ3) e “O
Sincronicídio” (https://www.amazon.com.br/Sincronic%C3%ADdio-sexo-morte-revela%C3%A7%C3%B5es-transcendentais-ebook/dp/B09L69CN1J/).
Coautor e roteirista de “ANUNNAKI - Mensageiros do Vento” (https://youtu.be/bBkdLzya3B4).
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MANIFESTO – Mensageiros do Vento
http://www.recantodasletras.com.br/e-livros/5823590
Um experimento literário realizado com muita autenticidade e ousadia. A ideia é apresentar um diálogo contínuo, não de diversos personagens entre si, mas entre as diversas vozes de um coral e o leitor. Seguir a pista do fluxo da consciência e levá-la a um surpreendente ritmo da consciência. A meta desse livro é gerar ondas, movimento e transformação na cabeça do leitor. Clarice Lispector, Ferreira Gullar, James Joyce e Virginia Woolf, entre outros, são grandes influências. Por demonstrarem que a literatura pode ser vista como uma caixa fechada, e que um dos papéis mais essenciais do escritor é, de dentro da caixa, testar os limites das paredes... Agora imagine esse livro escrito por uma banda de rock! É o que encontramos no livro MANIFESTO – Mensageiros do Vento, disponível aqui. Leia e descubra por si mesmo!
http://www.recantodasletras.com.br/e-livros/5823590
👏👏👏
ResponderExcluirSalve!
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