sábado, 30 de março de 2013

ALGUNS POEMAS E CARTAS A UM JOVEM POETA – Rainer Maria Rilke




Há muito tempo eu queria ler esse livro, e graças à gentileza do amigo Anderson ele finalmente veio parar nas minhas mãos. O livro é pequetito, cabe no bolso da camisa. O que confirma o dito de que os melhores perfumes estão nos menores frascos...

Sobre os poemas, senti neles ecos de beleza, mas era como se os lesse através de um véu. Nunca os problemas e limitações da tradução são tão evidentes quanto no caso da poesia. E ainda mais quando se trata de poesia rimada. Não é a tradução do poema, mas um novo poema escrito em outra língua, apenas inspirado no original. Isso não implica em demérito para o tradutor: é uma limitação inerente ao ato de traduzir.

Daí que não pude curtir tanto os poemas de Rilke,  justamente por saber que a sua essência está inacessível numa tradução, por melhor que seja. Ai de mim! que ainda não sei alemão... por enquanto tenho de me contentar com o eco da beleza...

Mas não deixei de me divertir por conta disso. Meu poema preferido foi “O Cisne”:

Este sacrifício de avançar
pelos feixes do irrealizado
lembra um cisne, altivo a caminhar.

E a morte – esse nada mais buscar
do chão diariamente repisado –
lembra a sua angústia de pousar

sobre as águas que o recebem mansas
e cedem sob ele, em suaves tranças
de marolas, que cercá-lo vem;
enquanto ele, calmo e independente
segue sempre majestosamente
como ao seu capricho lhe convém.


Cartas a um jovem poeta

Aí é que o bicho pega! Toda a poesia que estava inacessível jorra em corredeiras da prosa de Rilke em suas cartas ao jovem Kappus. Lindo é pouco!

Para mim foi especialmente um motivo de grande júbilo ler esse livro. É uma alegria muito grande perceber que as grandes almas falam todas a mesma língua! A sabedoria maior do coração não precisa de tradutor: cala fundo na alma e é assimilada no silêncio. O que Rilke está dizendo poderia ter sido dito por Gandhi, Tagore ou John Lennon, só para citar exemplos ao acaso. Perceber isso é inestimável!


Trechos

Para penetrar uma obra de arte, nada pior do que as palavras da crítica, que somente levam a mal-entendidos mais ou menos felizes. Nem tudo se pode saber ou dizer, como nos querem fazer acreditar. Quase tudo o que sucede é inexprimível e decorre num espaço que a palavra jamais alcançou. E nada mais difícil de definir do que as obras de arte – seres misteriosos cuja vida imperecível acompanha nossa vida efêmera.

O seu olhar está voltado para o exterior. Eis o que não deve tornar a acontecer. Ninguém pode dar conselhos nem ajudá-lo – ninguém! Só existe um caminho: penetre em si mesmo e procure a necessidade que o faz escrever. Observe se esta necessidade tem raízes nas profundezas do seu coração. Confesse à sua alma: “Morreria, se não me fosse permitido escrever?” Isto, principalmente.

Basta, no meu entender, sentir que se poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de fazê-lo.

É esta uma das mais rudes provas do criador, que deve permanecer na ignorância dos seus melhores dons, não os pressentir sequer, sob castigo de os privar da sua pureza, da sua virgindade.

É certo que as veredas da carne são difíceis, mas só o difícil nos interessa. Quase tudo o que é grave é difícil; e tudo é grave.

Para a maioria, isto apenas será possível num dia distante; mas “o homem solitário” pode desde já lançar as bases, construir o futuro com as suas mãos que se iludem menos. Por isso, prezado senhor, ame a sua solidão, suporte as penas que dela vierem, e, se essas penas lhe arrancarem queixas, que sejam belas essas queixas.

Os homens possuem, para todas as coisas, soluções fáceis e convencionais, as mais fáceis das soluções fáceis. Entretanto, é evidente que se deve preferir o difícil: tudo o que vive lá cabe.

Nunca, nem na morte, que é difícil, nem no amor, que também é difícil, aquele para quem a existência é uma coisa grave terá o auxílio de qualquer luz, de qualquer resposta já fornecida, de qualquer caminho previamente traçado. Não há regras gerais para nenhum destes deveres que trazemos ocultos em nós e que transmitimos àqueles que nos acompanham sem jamais os esclarecer. Na medida em que estamos sós, o amor e a morte tocam-se.


  
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MANIFESTO – Mensageiros do Vento
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2 comentários:

  1. Eita que lindoooo!!! Titularidade original ‘Briefe an einen jungen Dichter’ - Cartas a um jovem poeta, e por incrível que pareça tem sua titularidade traduzida idem a original ahaha, foi uma obra póstuma, editada 3 anos após sua morte...também li e amei, mas essa obra da sua resenha me parece que juntaram a ela alguns poemas. É tradução de quem, e que editora? Amei a junção....eu queroooooo!!! Coloca no PULA..ahaha

    Tenho uma história com esse autor. Cheguei a ele pelas mãos da russa escritora, transloucada e linda Lou Salomé... que eu amo. É que esse autor de nome de nascimento René foi amante de Salomé, aliás ela foi também amante de Nietzsche, Freud e outros...ahaha
    Li uma obra de Salomé com a titularidade ‘Rainer Maria Rilke’, daí fiquei curiosa, descobri que ele era também escritor e fui em busca de suas obras. Fiquei tão encantada e obcecada pela busca, que no meu aniversário de uns anos atrás ganhei de presente de um amigo alemão muito especial, a terceira edição de sua primeira obra, editada em 1894 ‘Leben und Lieder’ – Vida e canções, que virou o meu xodó. Também li ‘Das Merien Leben’ - A vida de Maria.

    Vários poetas traduziram esse autor, como Manuel Bandeira e Cecília Meirelles, mas concordo com você, eu também acho que as traduções carregam mais do tradutor do que do autor, principalmente em alemão, que é uma lingua que não tem uma tradução muito fidedigna, pela falta de correspondência...Sabia que ele foi secretário particular do escultor Rodin em Paris? Talvez seja por essa influência expressionista, com seu olhar em paralelo com a imagem x homem, que seus poemas se tornaram tão existencialistas e tão distantes do René meloso anterior, quando amava a fogosa Salomé. Ahah Eu e essa mania de xeretar a vida íntima dos autores...fofoca centenário...ahahh Bem...mas é melhor que ver BBB, ou saber pela revista Contigo, onde a mulher melão operou seu glúteo não é? ahah

    Amo esse poema de Rilke feito para Lou Salomé....olha que lindo!
    "Elimine meus olhos: eu poderei te ver,
    Arranque meus ouvidos: eu poderei te ouvir,
    E sem pés poderei caminhar até você,
    E sem boca ainda poderei te invocar.
    Corte meus braços, eu te segurarei
    Com meu coração como se uma mão fosse,
    Pare meu coração, e meu cérebro baterá,
    E incendeie meu cérebro,
    Então te carregarei em meu sangue."

    Me disseram que lá pelos anos 2000 saíram duas traduções de Augusto Campos com uma coletânea de poemas de titularidade Novos Poemas, mas infelizmente eu ainda não encontreiiiii! Puxaaa, sua linda resenha fez minha vontade pela busca ser reeditada em meu coração..ahahh

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    Respostas
    1. Lua, amei seus comentários, você tem o dom de fazer rir e refletir com a mesma frase!!!
      Não lembro se ainda estou com esse livro aqui, se estiver é seu!!!
      beijo!!!

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