quinta-feira, 5 de outubro de 2023

O MINISTÉRIO DO FANATISMO ADVERTE: LER ESSE LIVRO PODE CAUSAR A SUA MORTE!

 


Resenha do livro “OS VERSOS SATÂNICOS”, de Salman Rushdie

No dia 12 de agosto de 2022, o escritor Salman Rushdie foi esfaqueado de 10 a 15 vezes quando estava prestes a fazer uma palestra em um instituto em Nova Iorque. O autor perdeu um olho, os nervos de um dos braços foram cortados, impedindo-o de mover uma das mãos, e o seu fígado foi perfurado. Esse ataque foi consequência direta de uma ordem de assassinato proclamada em 1989 pelo Aiatolá Khomeini, então líder do Irã. O motivo da sentença: Salman Rushdie publicou em 1988 o livro “Os Versos Satânicos”.

Desde a proclamação da fatwa (sentença de morte), com um prêmio para o assassino que chegou a mais de três milhões de dólares em 2012, Rushdie viveu 30 anos escondido. Esse atentado de 2022 foi o segundo do qual ele escapou: em 1989, um livro-bomba explodiu antes da hora e acabou vitimando o próprio terrorista que tentou matar Rushdie. Essa fatwa contra ele foi renovada em 2005 por Ali Khamenei, sucessor de Khomeini, que chegou a declarar:

“Mesmo que Salman Rushdie se arrependa ao ponto de se tornar o homem mais piedoso do nosso tempo, a obrigação permanece para cada muçulmano, de o enviar para o inferno, não importa a que preço, e mesmo fazendo o sacrifício de sua própria vida.”


Preciso acrescentar que essa condenação à morte não se limitou ao autor e aos editores, como também a qualquer pessoa que venha a tomar conhecimento do conteúdo do livro. Em outras palavras, mediante o advento distópico de uma ditadura mundial muçulmana, o mero fato de você ter lido esta resenha já colocaria a sua vida em perigo. Prossiga por sua conta e risco!

Eu tinha 16 anos em 1989, e lembro com muita nitidez as matérias sobre o livro blasfemo que havia provocado uma sentença de morte para o seu autor. Evidentemente, fiquei curiosíssimo para ler “Os Versos Satânicos” (e também um pouco amedrontado, confesso). Queria muito saber o que poderia haver de tão ofensivo nesse livro a ponto de gerar uma resposta tão drástica e desproporcional.

34 anos depois, graças ao carinho de minha querida amiga e irmã poeta Neuza de Brito Carneiro, a minha curiosidade finalmente pôde ser saciada, antes de ser exponencialmente aumentada. É que Neuza pegou para ler “Os Versos Satânicos”, e achou o estilo de Salman Rushdie parecido com o meu!!! Fiquei realmente intrigado e logo em seguida muito feliz quando chegou pelo correio o presente da amiga tão gentil: nada menos que um exemplar do livro maldito!

Comecei a ler com avidez. Antes de ser comparado tão generosamente a Salman Rushdie, imaginava que o texto de “Os Versos Satânicos” era árido e erudito, carregado de passagens herméticas, de difícil compreensão. Ledo engano! Logo nas primeiras páginas pude compreender porque esse livro foi considerado tão perigoso: a história apresenta várias passagens hilariantes, carregadas de feroz ironia, que não poupa nada nem ninguém. Não deixa de ser uma ironia à parte que a vida ocidental na Londres moderna é satirizada na mesma medida (ou mais) que a história do profeta Maomé.

Ao terminar a extensa leitura (a edição que li tem quase 600 páginas), ficou muito evidente estar diante de um livro muito bem escrito, com grande talento e originalidade. Por conta do realismo mágico que permeia toda a trama, é inevitável evocar algo de Gabriel García Márquez, mas as diferenças entre Gabo e Rushdie são mais notáveis que as semelhanças. Depois descobri que boa parte dos eventos citados no livro são inspirados em acontecimentos reais. Saber disso fez o livro ficar ainda maior aos meus olhos. Bravo! Bravíssimo!

Inevitável também é refletir sobre as tristes consequências do fanatismo e da intolerância, seja de qual matiz for. A religião muçulmana é digna e honrada, mas torna-se maculada por essas hordas de fanáticos que tentam impor à força um retorno à Idade das Trevas. Aqui no Brasil, atualmente vemos crescer de forma alarmante um fanatismo cada vez mais agressivo que profana tão tristemente a mensagem do Cristo, justamente em nome de quem são cometidas tantas feiuras. Só Jesus na causa para abrir a mente desse povo!


Encerro com algumas passagens de “Os Versos Satânicos”. Novamente, leia por sua conta e risco:

“É a função do poeta (...) nomear o inominável, apontar as fraudes, tomar partido, despertar discussões, dar forma ao mundo e impedir que adormeça.”

“Alguma coisa deve estar profundamente deslocada na vida espiritual do planeta, pensou Gibreel Farishta. Demônios demais dentro das pessoas que alegam acreditar em Deus.”

“Se os poderosos pisam em você, você fica infectado pela sola de seus pés.”

“’O Sol sempre se põe quando se temem os tigres’, citou o antigo ditado: as más notícias sempre vêm de uma vez.”

“O universo era um lugar de maravilhas, e só o hábito, a anestesia do cotidiano, turvavam nossa visão.”

“É quase sempre decepcionante conhecer pessoalmente um escritor.”

“(...) o que fez Salman, o persa, começar a imaginar que tipo de Deus era esse que soava tão parecido com um homem de negócios.”

“Onde não há crença não há blasfêmia.”

“Ninguém é capaz de avaliar uma dor íntima pelo tamanho da ferida superficial, do buraco.”

“A decisão de fazer o mal nunca é tomada definitivamente até o próprio momento do ato; sempre existe uma última chance de retirada.”

“Não é de admirar que não se consiga manter a concentração em nada por muito tempo; não é de admirar que se inventem aparelhos de controle remoto para mudar de canal. Se virássemos esses instrumentos para nós mesmos, iríamos descobrir mais canais do que jamais sonhou qualquer magnata das TVs a cabo e por satélite...”

“Quem quer que esteja nas proximidades de um moribundo está inteiramente à sua mercê. Socos desferidos de um leito de morte deixam marcas que nunca se apagam.”

“De agora em diante, preciso pensar que estou vivendo no primeiro instante do futuro.”


 

 

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FABIO SHIVA é músico, escritor e produtor cultural. Autor de “Favela Gótica” (https://www.verlidelas.com/product-page/favela-g%C3%B3tica), “Diário de um Imago” (https://www.amazon.com.br/dp/B07Z5CBTQ3) e “O Sincronicídio” (https://www.amazon.com.br/Sincronic%C3%ADdio-sexo-morte-revela%C3%A7%C3%B5es-transcendentais-ebook/dp/B09L69CN1J/). Coautor e roteirista de “ANUNNAKI - Mensageiros do Vento” (https://youtu.be/bBkdLzya3B4).

 

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Instagram: https://www.instagram.com/fabioshivaprosaepoesia/

 

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4 comentários:

  1. Como sempre, Fábio Shiva recolhe o que há de melhor para fazer uma resenha. Tanto que deixa seus leitores com sede de ler muito e muito mais.

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    1. Gratidão pelo carinho de seu comentário e por essa energia boa!

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