sábado, 13 de julho de 2024

AQUI, NESSA MESA DE BAR, UM GRANDE LIVRO SOBRE A DITADURA MILITAR NO BRASIL

 


Resenha do livro “BAR DON JUAN”, de Antônio Callado

Antônio Callado é um de meus escritores favoritos. Fiquei encantado com a profundidade e elegância de sua prosa desde que li “A Madona de Cedro” (https://comunidaderesenhasliterarias.blogspot.com/2012/04/madona-de-cedro-antonio-callado.html), que senti ser o equivalente brasileiro de “Crime e Castigo” (https://comunidaderesenhasliterarias.blogspot.com/2012/04/crime-e-castigo-fiodor-dostoievski.html). Então li “Quarup” (https://comunidaderesenhasliterarias.blogspot.com/2019/04/quarup-antonio-callado.html), considerado sua obra-prima, que me deixou impactado com uma Literatura vasta como a própria vida. “Reflexos do Baile” (https://comunidaderesenhasliterarias.blogspot.com/2021/12/quem-tem-medo-da-literatura-brasileira.html), que li em seguida, consegue a proeza de ser ainda mais audacioso e genial, como um suspense hermético que exige inteligência e empenho de seus leitores.


E agora, ao terminar feliz e comovido a leitura de “Bar Don Juan”, sinto que fechei uma espécie de trilogia de Antônio Callado. Pois esse livro, de forma ainda mais direta que “Quarup” e “Reflexos do Baile”, tem como tema e pano de fundo a ditadura militar no Brasil.

Aliás, fiquei muito surpreso ao descobrir que “Bar Don Juan” foi escrito em 1970 e publicado em 1971, durante o ápice da repressão e da censura. Pois o autor fala abertamente da ditadura, chegando ao ponto de abrir o livro com uma cena impactante: um casal de “subversivos” conversando sobre a tortura que os dois sofreram no porão de uma delegacia, onde um dos policiais estuprou a mulher na frente do marido.


Mas não pensem que a história recorre ao dramalhão, e muito menos que cai nas armadilhas da apologia ou do proselitismo. Primeiro, porque Antônio Callado é um mestre da “sutil arte do eufemismo”, como é bem definida a escrita de ficção. Sua prosa é contida e enxuta, sem a menor condescendência com arroubos sentimentais. A leitura nos emociona pela força daquilo que está sendo contado, não por algum sensacionalismo barato (recurso fácil e tentador ao contar uma história que envolve tortura e outros abusos de poder).

Em segundo lugar, Antônio Callado é impressionantemente lúcido em sua análise dos movimentos de luta armada e guerrilha no Brasil durante a ditadura militar, expondo sem clemência todo o seu romantismo, despreparo e desconexão com a realidade. Isso torna ainda mais portentoso o fato de esse romance ter sido escrito em 1970. Hoje, pela privilegiada perspectiva do tempo, a leitura de “Bar Don Juan” acentua a trágica ironia do golpe militar de 1964, que teve como pretexto combater os grupos de “subversivos comunistas”, que eram praticamente inexistentes nessa época. Os tais “guerrilheiros” só surgiram mesmo no Brasil depois do golpe militar, justamente como uma pífia – e dolorosamente heroica – tentativa de confrontar a ditadura.


E o mais trágico nessa história é que até hoje esse papo furado de “combater o comunismo” continua induzindo muita “gente de bem” a endossar as piores vilanias...

Encerro com esse trecho de “Bar Don Juan”, que traz uma tocante descrição da morte de Che Guevara:

“Disparou na direção dos tiros mas os tiros saíam das árvores feito pássaros. Correu para lutar perto do Comandante mas o Comandante caiu sobre o joelho direito. Aproximou-se mais e o Comandante levou outro tiro no braço e no fuzil, que eram uma coisa só. A arma da revolução quebrada e jogada fora pela América Latina arriscada de perder seu emprego de criada e puta. Criada e puta, pensava Eustáquio furioso de ver morrer o Comandante no mato do Yuro quando devia ser fuzilado domingo ao meio-dia na frente do maior edifício de New York.”


 

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FABIO SHIVA é músico, escritor e produtor cultural. Autor de “Favela Gótica” (https://www.verlidelas.com/product-page/favela-g%C3%B3tica), “Diário de um Imago” (https://www.amazon.com.br/dp/B07Z5CBTQ3) e “O Sincronicídio” (https://www.amazon.com.br/Sincronic%C3%ADdio-sexo-morte-revela%C3%A7%C3%B5es-transcendentais-ebook/dp/B09L69CN1J/). Coautor e roteirista de “ANUNNAKI - Mensageiros do Vento” (https://youtu.be/bBkdLzya3B4).

 

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Instagram: https://www.instagram.com/fabioshivaprosaepoesia/


 

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Contos da Era Bolsonaro - baixe o livro gratuitamente:

https://www.recantodasletras.com.br/e-livros/6871467

 

Foi disponibilizado gratuitamente nas plataformas digitais o livro “TANTO TEMPO DIRIGINDO SEM NINGUÉM NO RETROVISOR: Contos da Era Bolsonaro”, de Fabio Shiva. 

Os contos do livro nascem de uma perplexidade comum a milhões de brasileiros: como é que Bolsonaro foi eleito? Como é possível que, depois de tantos absurdos, ainda tenhamos parentes e amigos apoiando fanaticamente o governo? O que aconteceu com essas pessoas? O que aconteceu com o Brasil?

Para lidar com os horrores do obscurantismo que assola o país, precisamos mais do que nunca das luzes da Arte. E é assim que a Literatura Fantástica surge como uma resposta lúdica e inesperada diante de mesquinhas realidades.

Nas oito histórias aqui reunidas, Fabio Shiva explora os pontos cardeais desse grande enigma brasileiro:

* Será que o bolsonarismo surgiu de uma epidemia cósmica? - “O ódio que veio do espaço”

* Ou será tudo parte de um audacioso plano traçado na espiritualidade? - “Acima de todos”

* Será que isso implica no fim do mundo como o conhecemos? - “A espera”

* Como será o futuro dominado pelas Fake News? - “Notícias da Democracia”

* E o que aconteceria se ninguém mais pudesse mentir? - “Verdade e Consequência”

Que essas e outras incômodas perguntas aqui apresentadas possam fortalecer os leitores em seu processo de resistência vital contra o culto generalizado da morte: a morte da natureza, a morte da educação e da cultura, a morte da diversidade, do respeito e de tudo o que nos faz ter orgulho de sermos brasileiros. Contra as trevas da ignorância, salve a nossa Literatura!

 


 

 

 

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