quinta-feira, 12 de outubro de 2017

LINHA DO TEMPO – Michael Crichton


Esse livro me fez parar de beber Coca-Cola.

Michael Crichton é um autor de extremo êxito comercial, com mais de 200 milhões de livros vendidos em todo o mundo e inúmeras adaptações de suas obras para o cinema, como “Jurassic Park” e sequências, além de “Westworld”, “Congo” e o próprio “Linha do Tempo”, entre outros.

A trama de “Linha do Tempo” é bem instigante e original, misturando ficção científica, thriller e romance histórico. Em resumo: uma equipe de historiadores é enviada de volta no tempo até a Idade Média, graças a uma secreta tecnologia criada por uma megacorporação a partir da Mecânica Quântica. Chegando lá, os heróis vivem inúmeras aventuras, enquanto, no tempo presente, os cientistas da corporação se esforçam para trazer a turma de volta.

E o que é que a Coca-Cola tem a ver com isso? Isso é o que pergunto eu! Pois não é que lá pela página 300 e tanto (o livro é um tijolo) eu me deparo com um descarado e inegável merchandising dos refrigerantes da Coca-Cola!?!

A cena acontece assim: dois dos cientistas que estão tentando trazer a equipe de volta para o presente fazem uma pausa em seus incansáveis esforços. Vão até uma máquina de refrigerantes e escolhem entre os sabores de Coca-Cola, Sprite e Fanta (todos produtos da mesma corporação, sendo que, para quem não sabe, a Fanta foi criada durante a Segunda Guerra especificamente para os nazistas). E então um dos cientistas diz para o outro algo como: “Como estamos no deserto, é muito importante hidratar bem o organismo.” E os dois bebem gutiguti suas latas de líquido delicioso e refrescante. Só faltou a musiquinha empolgante e a mãozinha na cintura ao pôr-do-sol.

Para não deixar absolutamente nenhuma dúvida de que se tratava mesmo de uma cena de merchandising, umas dez páginas depois a Coca-Cola aparece de novo, em uma indecorosa associação com poder e êxito financeiro.

Se eu fosse expressar o tamanho de minha indignação, escreveria um livro mais grosso que “Linha do Tempo”. Fiquei sobretudo pê da vida comigo mesmo, por minha ingenuidade em considerar a Literatura um território sagrado, livre de tais profanações. Mas vou tentar explicar ao menos, sucintamente, porque acho que Michael Crichton merece o mármore do inferno.

“Linha do Tempo” é um thriller científico, embasado por muitos estudos sérios sobre Mecânica Quântica e outros tantos sobre História Medieval, a ponto de exibir uma orgulhosa bibliografia de várias páginas de obras científicas. E, ao mesmo tempo, a obra é voltada para o público jovem e adolescente, consumidor de aventuras no estilo “Parque dos Dinossauros”. Então considere: você lê algo sobre Mecânica Quântica que nitidamente está embasado em pesquisa, depois lê descrições da Europa medieval que também são claramente apoiadas por pesquisa histórica. Então você confere CREDIBILIDADE à narrativa. E logo em seguida, ao ler que a Coca-Cola é boa para hidratar o organismo, a tendência é que aceite isso como um fato! Principalmente se for um adolescente inseguro sobre seu papel na sociedade e ansioso por aceitação!

Isso a despeito do fato de ser público e notório (exceto para os que usam a Internet apenas para jogos e pornografia) que a Coca-Cola possui tanto açúcar que faria a pessoa vomitar no primeiro gole, caso esse açúcar não fosse contrabalançado por uma quantidade estúpida de sal. E que para cada copo de refrigerante precisaríamos beber TRINTA E DOIS copos de água meramente para minimizar os danos causados ao organismo!


Fiquei me sentindo tão mal com essa leitura que precisei encontrar algo de positivo nela, que acabou sendo a resolução de NUNCA MAIS beber um maldito refrigerante em minha presente encarnação. Michael Crichton, você merece o meu desprezo, por me mostrar que o dinheiro está mesmo acima de tudo para certas pessoas, mas também a minha gratidão, por demonstrar que em todas as situações podemos tirar algo de positivo!


\\\***///


ESCRITORES PERGUNTAM, ESCRITORES RESPONDEM
Escrever para quê? 
Doze escritores dos mais diversos estilos e tendências, cada um de seu canto do Brasil, reunidos para trocar ideias sobre a arte e o ofício de escrever. O resultado é este livro: um bate-papo divertido e muito sério, que instiga o leitor a participar ativamente da reflexão coletiva, investigando junto com os autores os bastidores da literatura moderna. Uma obra única e atual, recomendada a todos os que amam o mundo dos livros.
Disponível no link abaixo, leia e compartilhe:
http://www.recantodasletras.com.br/e-livros/5890058
 

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