Esta é a história contada por Natascha Kampusch, refém sobrevivente do maior seqüestro da historia de que se tem notícia. A obra, autobiográfica, retrata as fases da vida da menina/mulher, que após afastada do âmbito familiar, tentou se adequar a um mundo criado por um outro – aquém da realidade e beirando a loucura. Aquela que poderia ser narrada como ficção, nada mais foi do que um relato de quem viveu na pele as marcas da separação, da opressão, e da força de uma pessoa descontrolada psicologicamente exercida dia apos dia.
Aos 10 anos, com um mundo de possibilidades pela frente, encabeçado pelo sonho de ser atriz e de ganhar a independência de seus 18 anos, foi raptada em uma caminhonete branca a caminho da escola por um homem denominado posteriormente de Wolfgang Priklopil – um daqueles psicopatas sociais que circundam a nossa existência e se passam por normais.
Para narrar toda sua experiência, Natasha descreve o livro em três momentos distintos: no início, descreve seu relacionamento com a família e os espaços que preenchem suas memórias de criança - lembranças que auxiliam na identificação do seu espaço durante o cativeiro e da representação de sua identidade; em um segundo momento, estabelece o relacionamento com o sequestrador e como se deu a construção do cativeiro – do físico ao psíquico, do cativeiro do corpo ao cativeiro da alma; por fim, no terceiro momento, narra os acontecimentos finais desta fase – quais conseqüências e rumos tomaram sua vida, de sua família e do sequestrador.
Este, que até então seria condenado pela sociedade, revela-se ponto de conexão entre a vítima e o mundo exterior, ganhando deste modo importância e forçando uma necessidade de presença para com a seqüestrada. Através de uma narrativa crítica, ela tenta definir os comportamentos adotados pelo homem e por si durante os anos que se estabeleceram e as conseqüências destas para sua vida.
Detalha sua trajetória no cativeiro e como as constantes ameaças de Wolfgang Priklopil construíram em sua vida limites psíquicos mais reais e fortes que as barreiras físicas que a separavam do mundo exterior. Descreve através da temporalidade, como os laços da menina, transformada em mulher, fortaleciam também os laços simbólicos com a condição instituída, aprisionando-a além das paredes.
Reflete com certa propriedade as vertentes assumidas pelo criminoso. O "vilão", se é que assim pode ser chamado, é humanizado através das palavras da autora, quando esta percebe nele um ser humano dotado de sentimentos e vontades - mesmo assumindo uma postura fora do comum, não merece ser julgado única e exclusivamente como culpado.
Os conflitos psicológicos são estabelecidos e revelados ao leitor através das linhas do texto, o que permite uma maior aproximação da realidade vivida. O leitor vive o terror psicológico instituído através de ameaças constantes e agressões físicas do malfeitor à vítima. Na condição de espectador, a torcida pela liberdade é gritante a todo o momento e o sentimento da incapacidade de interferir nesta história é também marcante. É importante destacar que a concepção de independência estabelecida em seus 18 anos, antes mesmo de imaginar ser raptada, acaba se transformando no ponto restaurador de sua liberdade, um compromisso assumido que concretizaria a nova reviravolta de sua vida.
A angústia descrita por Natascha faz com que o fim seja o momento mais esperado da narrativa – no intuito de possibilitar a sua liberdade e a do próprio leitor, que a esta altura está preso ao livro e a necessidade de conhecer com detalhes o fim da história sem os estardalhaços da mídia. Final este, que ganharia contornos de grandes clássicos literários se não fosse em essência um final tragicamente real.
Muito boa resenha de uma impressionante história da vida real!
ResponderExcluirAh, adorei a sua resenha ;* Esse livro já está a bastante tempo na minha estante, só preciso arrumar tempo para lê-lo 'Haha
ResponderExcluirBeijos&beijos
Book is life