MATADOURO Nº 5 ou A CRUZADA DAS CRIANÇAS – Kurt Vonnegut Jr.

Absolutamente espetacular!

Quaisquer que tenham sido as minhas expectativas ao abrir esse livro, elas foram imensamente superadas durante uma frenética leitura que não fui capaz de interromper até chegar à última página! Uma obra-prima da literatura mundial, sob qualquer ponto de vista.

O autor conseguiu acumular proeza sobre proeza nesse esplêndido trabalho. Imagine uma narrativa genuinamente engraçada e irônica a respeito dos horrores da guerra e dos absurdos da vida moderna. Imagine uma deliciosa mistura entre ficção e realidade (o autor efetivamente lutou na segunda guerra mundial e, como prisioneiro, testemunhou a destruição de Dresden por bombardeiros aliados – mote principal do livro).

Até aqui dá para imaginar e ver que o livro é mesmo no mínimo interessante. O que não tem como imaginar, que só lendo para saber, é o originalíssimo e carismático estilo de Kurt Vonnegut Jr. A construção da narrativa, fragmentada no tempo e no espaço, é por si mesma a crítica mais eloqüente que o autor poderia fazer à irracionalidade suprema da guerra. Gênio, gênio, gênio!!!

A mistura entre fato e invenção, aliás, confere um clima definitivamente onírico à narrativa, o que se adéqua com perfeição à saga de Billy Pilgrim, o anti-herói da história. Feito prisioneiro dos nazistas e, assim como o autor, enviado para o Matadouro Nº 5, Billy Pilgrim foi abençoado ou amaldiçoado com a capacidade de ficar solto no tempo. Ele vê a vida passar em flashes desconexos, oscilando a todo momento entre o presente, o passado e o futuro. Sua vida não ficou menos estranha após a sua abdução por um disco voador de Tralfamador, para onde foi transportado e exibido como bicho de zoológico, juntamente com uma ex-atriz de Hollywood que também foi capturada para copular com Billy, para delírio dos Tralfamadorianos.

É contra essa teia de absurdos que são jogados os horrores muito reais da guerra, e assim Vonnegut obtém o seu sublime efeito! Ficamos chocados enquanto rimos, damos risada e ao mesmo tempo ficamos pasmos. Como já ensinava Molière, “ridendo castigat mores”. Lição que Vonnegut passou a limpo e com esmero!

Kurt Vonnegut Jr é dos raros escritores que não se contentam em provocar em nós a paixão pela leitura. Eles fazem brilhar também a paixão por escrever, a vocação do escritor que dorme no peito de cada leitor, ao mostrar de forma tão cabal que grandes alturas podem ser alcançadas através desse nobre e penoso ofício.

Álvaro Pacheco, então editor da Artenova, assim encerrou o texto de apresentação a essa obra inesquecível:

“É um livro para ler e reler, o trabalho perfeito de um gênio criador que disseca a condição humana e revela o homem ao homem, em seus mais íntimos segredos.”

É isso aí!