sexta-feira, 5 de abril de 2019

A VOLTA AO MUNDO EM OITENTA DIAS – Júlio Verne



Antes de comentar sobre o livro, sinto que devo falar sobre como ele chegou às minhas mãos. Já faz um bom tempo que praticamente todos os livros que leio chegam através do P.U.L.A. (Passe Um Livro Adiante): pego, leio e passo adiante. E assim tenho lido sempre do bom e do melhor! Pois então, recentemente fui convidado a falar no Clube de Leitura Scotland Books (https://youtu.be/MtzbZkM-Ms4), e lá mencionei o fato de livros de ficção científica estarem entre meus favoritos. Ao chegar em casa, pensei que já fazia algum tempo que eu não lia um bom livro de FC e em como seria legal se eu encontrasse um livro assim no P.U.L.A. E no dia seguinte, surpresa: lá está me esperando esse livro do Júlio Verne, que hoje é um clássico da literatura mundial, mas na época em que foi publicado, em 1873, era ficção científica de primeiríssima qualidade! Claro que iniciei a leitura imediatamente. Por essas e outras é que me considero um feliz milionário de livros!


Antes de “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias”, de Júlio Verne eu só tinha lido “Miguel Strogoff”, ainda criança. Cheguei a citar “Viagem ao Centro da Terra” em meu romance “O Sincronicídio” (http://caligoeditora.com/?page_id=98), como o único livro de Verne que ainda não havia se tornado realidade, mas para essa citação me contentei em ler uma adaptação em quadrinhos.

A prosa de Júlio Verne é mesmo muito gostosa, recheada de cenas aventurescas com toques de humor, em uma combinação muito atraente. Os personagens são um tanto bidimensionais, mas dentro do contexto da trama isso não chega a ser um empecilho à boa fruição da leitura. Não resta dúvida de que o grande êxito que a obra alcançou, desde a época de sua publicação até os dias de hoje, é plenamente justificado.

Uma outra leitura se impõe, contudo, ao olhar de um leitor contemporâneo, que está a quase 150 anos de distância da sociedade que foi o pano de fundo de “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias”. O que primeiro chama a atenção é o quanto a história está impregnada de evolucionismo cultural e etnocentrismo. Aqui as nações e povos do mundo são nitidamente percebidos e retratados como uma fila evolutiva que tem seu ponto mais elevado e desenvolvido na civilização europeia de modo geral e, em particular, no império britânico, representado pelo fleumático protagonista Phileas Fogg. Curiosamente, o francês Passepartout, conterrâneo de Verne, é retratado de forma humorística, funcionando como alívio cômico para as aventuras do herói.

Nesse contexto evolucionista, não deve ter causado estranheza aos leitores do século XIX que os indianos tenham sido retratados como um povo bárbaro e escandalosamente ignorante, que as mulheres japonesas tenham sido descritas como “pouco belas” e os índios americanos tenham entrado na história apenas para serem “esmagados como vermes”. Contudo, a um olhar de hoje tais descrições provocam repulsa e repúdio – ou ao menos deveriam provocar.

Dentro de um enfoque mais pessoal, percebi na leitura de “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias” uma provavelmente involuntária metáfora para o intenso progresso tecnológico experimentado pela humanidade desde a revolução industrial, ao qual, infelizmente, não corresponde um equivalente progresso espiritual. Assim é que Phileas Fogg dá a volta ao mundo em desabalada carreira (para os padrões da época), sem contudo ter um mínimo de curiosidade a respeito das paisagens e povos que ele estava visitando com tanta pressa. A ponto de preferir ficar trancado em sua cabine, jogando cartas, sem ver nem aprender nada de novo. A meta da volta ao mundo constitui, em resumo, uma vitória da eficiência técnica, e nada diz respeito a um aprofundamento da mente e da alma. De que vale dar a volta ao mundo e voltar para casa exatamente o mesmo?

Este livro, em domínio público, está acessível em PDF:



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