segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

A (IN)DIGNIDADE DO CORPO COMO SÍMBOLO DA (IN)JUSTIÇA SOCIAL

 


Resenha do livro “OS RESTOS MORTAIS” de Fernando Sabino

Tempos atrás li uma deliciosa crônica do Fernando Sabino sobre a arte de escrever, que me marcou muito. Infelizmente não lembro em que livro li essa crônica, que é repleta de citações de grandes autores sobre o ofício da escrita, mas guardo na caderneta do coração duas referências que muito têm me ajudado em minha jornada de escritor. A primeira é a sintética e brilhante definição de Sinclair Lewis: “Escrever é a arte de sentar o traseiro em uma cadeira.”

E a segunda, cujo autor não lembro, fala sobre como um escritor experiente é capaz de escrever uma boa narrativa a partir de uma história banal, dessas que poderiam ser contadas à mesa de jantar. Mas o escritor iniciante, por não dominar ainda as técnicas e truques do ofício, precisa pagar o devido tributo à Musa e colocar o próprio coração, sangrando, na mesa de jantar. Essa metáfora, tão vívida, muito tem me inspirado a continuar sendo sempre um escritor “iniciante”, disposto a eviscerar-se de novo e de novo em honra aos deuses da Literatura.

Sem que isso, contudo, implique em deixar de apreciar a habilidade de um velho mestre, que é capaz de tecer uma bela tapeçaria a partir de poucos fios da narrativa. Como é bem o caso de “Os Restos Mortais”, onde Fernando Sabino exibe sua perícia, adquirida ao longo de décadas de excelente prática literária. O mote da história é inspirado em um episódio verídico vivenciado por um amigo do autor: um jovem médico que se vê às voltas com o cadáver de um humilde empregado do pai, cujo enterro vai sendo continuamente adiado, em um clima de crescente pesadelo.

A trama em si não tem nada de espetacular, sendo bem do tipo que se poderia contar “à mesa de jantar” (exceto, talvez, pelo tema mórbido). Mas nas mãos de Sabino a história ganha nuances e propõe reflexões, permanecendo na mente do leitor após a leitura. Boa parte dessas reflexões passa pela simbologia dos ritos fúnebres em nossa sociedade, que reproduzem as diferenças que insistimos em estabelecer entre os vivos: também após a morte, existem ricos e pobres.

“Enterrar os mortos! Os restos mortais. O pior da morte é o corpo que ela deixa atrás de si. Devia sumir, esvair-se no ar, sem ficar sequer a lembrança de jamais haver existido.”

A novela “Os Restos Mortais” foi originalmente publicada como parte da obra “Aqui Estamos Todos Nus”. Nessa nova edição, separada dos outros textos, a narrativa ganhou um tratamento de história para o público jovem, o que provavelmente não foi a intenção original do autor, mas que não deixa de ser uma iniciativa válida, devido à leveza e a simplicidade da prosa. Se alguém não aprende a gostar de ler com Fernando Sabino, restam poucas esperanças.

O que eu mais gostei nessa edição foi uma entrevista com o autor, publicada no início do livro. E de lá retirei mais uma verdadeira pérola, que guardarei com carinho em meu baú de tesouros literários:

“Escrever não é propriamente um sofrimento, mas uma obrigação. A literatura me sustenta não apenas no sentido econômico, mas também existencial. Só atinjo minha verdadeira dimensão, e presto contas a Deus, através da literatura. O que eu busco escrevendo é saber quem sou. Para que eu seja do meu tamanho, como todo mundo deve ser do seu: nem maior, nem menor. Quero dar o melhor de mim, ir ao extremo de mim mesmo. Não pretendo me exceder, mas também não quero ficar devendo. Esse é o meu objetivo na literatura e na vida.”  



 

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Finalmente disponível em e-book o livro duplo dos contos de Fabio Shiva. Os contos aqui presentes foram originalmente publicados com cada metade impressa de ponta cabeça com relação à outra, de forma que a capa de um livro era a contracapa do outro. O livro organizado dessa forma expressa a ideia dos contos estruturados como seis pares de “opostos espelhados”. As histórias têm como fio condutor a polarização entre o Olhar e a Consciência, representados nas capas dos dois livros como as pupilas sobrepostas em ISSO TUDO É MUITO RARO e o cérebro em LABIRINTO CIRCULAR. Cada um dos contos trata de um tema específico, que é abordado de forma totalmente diferente em seu reflexo distorcido no “alter livro”.

 


 

LABIRINTO CIRCULAR

https://www.amazon.com.br/Labirinto-Circular-Fabio-Shiva-ebook/dp/B09MSVN9GZ

 

O ARMAZÉM – inquietante visita ao purgatório dos escritores suicidas (tema: Sobrenatural).

SOM ALTO – uma solução drástica para o incômodo vizinho que gosta de ouvir música ruim no volume máximo (tema: Assassinato).

AMOR, ETERNO RETORNO – hilariante evidência de que tudo é relativo, até o amor (tema: Carta).

DA ARTE DE CHUPAR (O) PICOLÉ – peça de teatro surreal sobre bizarras questões sexuais (tema: Literatura).

BACKUP – isso nunca aconteceu durante uma invasão reptiliana (tema: Ufologia).

O MINIBARATA – narrativa épica de baratas mutantes que adquirem inteligência em pleno apocalipse zumbi (tema: Saga).

 


 

ISSO TUDO É MUITO RARO

https://www.amazon.com.br/Isso-Tudo-%C3%89-Muito-Raro-ebook/dp/B09MSWTTBP

 

EU, GAMEBOY – uma experiência definitiva de simulação de realidade (tema: Sobrenatural).

A MARCA – o estigma do crime de morte presente na humanidade desde tempos imemoriais (tema: Assassinato).

MENSAGEM DENTRO DE UMA GARRAFA PET – relato de uma vida diante do fim do mundo (tema: Carta).

1% – a aventura de um escritor genial prestes a escrever sua obra-prima (tema: Literatura).

ANGÉLICA E AS FADAS – a versão extraterrestre de “O Patinho Feio” (tema: Ufologia).

ISSO TUDO É MUITO RARO – spin-off de “O Sincronicídio: sexo, morte & revelações transcendentais”, que traz um concurso de discursos regado a vinho e xadrez (tema: Saga).

 

Histórias para mentes inquietas e questionadoras e que abordam, cada uma a seu modo, alguns dos antagonismos essenciais: Amor e Morte, Cotidiano e Fantástico, Concreto e Absurdo.

 

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