Resenha de “RICARDO III”, de William Shakespeare
Li pela primeira
vez essa obra-prima da literatura mundial em 1999, no original em inglês acrescido
de ricas notas históricas que baixei da Internet. Por essa época eu estava
lendo Shakespeare com o intuito específico de colher referências (e inspiração)
para as letras da ópera rock “VIDA – The Play
of Change”, da banda Imago Mortis (https://www.youtube.com/playlist?list=OLAK5uy_k74iGArOs3L8rNNxGpll976kufUVjE8EQ).
E dessa leitura saíram ao menos duas citações diretas na música “Insominia” (https://youtu.be/w6YVeR47SP0). Uma é a sensacional
frase de abertura da peça:
“Now is the winter of our
discontent
Made glorious summer by this
sun of York”
[“Agora é o inverno de nosso
descontentamento,
Tornado em glorioso verão por
este sol de York.”]
E a outra é uma
das frases mais impactantes do Bardo:
“I'll join with black despair
against my soul,
And to myself become an enemy.”
[“Eu me unirei ao negro
desespero contra a minha alma,
E para mim mesma me tornarei
uma inimiga.”]
Com essa fala, que é pronunciada pela Rainha Elizabeth ao saber da morte de seu marido, Shakespeare expressa em vívidas cores toda a dor do luto. Nessa única frase, que não cessa de me emocionar, diviso toda a magia e todo o poder da Literatura. Ao traduzir o sofrimento humano na linguagem da Beleza, a Arte ressignifica e transcende o sofrimento, conferindo-lhe sentido.
Em 2010, tive uma segunda oportunidade de ler “Ricardo III”, na tradução para o português de Carlos Alberto Nunes. Dessa vez, o foco de minha atenção concentrou-se na história, mais especificamente na magnífica articulação entre ação e consequência que é delineada ao longo da peça, em uma das melhores demonstrações da Lei do Karma na Literatura (https://comunidaderesenhasliterarias.blogspot.com/2012/09/a-tragedia-do-rei-ricardo-iii-william.html).
E agora, em 2022,
decidido a mergulhar novamente nessas salutares águas de Shakespeare, voltei a
ler a edição em inglês com os comentários históricos. Por um capricho
simétrico, vou destacar os três principais aprendizados que tive nessa terceira
leitura de “Ricardo III”:
1) Um grande vilão na Literatura, um homem de seu
tempo na vida real
Todas as notas
históricas dessa edição on-line (da qual eu havia felizmente guardado as
impressões, pois não mais encontrei na Internet) foram baseadas no livro “Richard III”, de Charles Ross. Essas
notas reiteram que a sanguinária escalada ao poder de Ricardo III é considerada
mais ou menos dentro dos padrões do jogo político da época (Século XV): ele foi
acusado do assassinato do irmão, dos dois sobrinhos (ainda crianças) e da
própria esposa, e mandou executar vários antigos ex-aliados, na tentativa de
assegurar sua ascensão ao trono da Inglaterra. Mas de nada adiantou sujar tanto
as mãos de sangue: o reinado de Ricardo III durou pouco e ele terminou odiado
pelo povo e por seus pares, sendo morto na batalha em que Shakespeare o fez
dizer, de forma tão emblemática: “Meu reino por um cavalo!”
2) “Show, don’t
tell”… unless you are Shakespeare!
Percebi somente agora
um recurso que Shakespeare parece usar com frequência: seus personagens são
dotados de uma incomum capacidade de autoanálise, descrevendo suas emoções e
conflitos internos de forma exuberante. Isso contraria diretamente uma das
regras douradas da escrita, que diz: “Show,
don’t tell” [“Mostre, não conte”]. Essa regra, que faz todo sentido para os
mortais comuns, parece não se aplicar no caso da genialidade ímpar de
Shakespeare. Só para dar um exemplo: o escritor não deve “contar” que seu
personagem está triste, com medo e remorso, mas “mostrar” por meio de cenas e
ações que esse é o seu estado emocional. A não ser que o escritor seja W.S.,
que faz seu Ricardo dizer, pouco antes da batalha final:
“O coward conscience, how dost
thou afflict me!”
[“Ó consciência covarde, como me
afliges!”]
3) A tragédia do Rei Ricardo III não deveria ser
usada como manual de campanha do governo
Mas o que me
deixou realmente estupefato foi acompanhar a maquiavélica estratégia de Ricardo
para tomar o poder, lendo isso agora, em 2022, à luz de tantos absurdos que
temos testemunhado no cenário político nacional e mundial. Vou tentar resumir
as macabras táticas utilizadas tanto no século XV quanto no XXI:
- Fazer o mal e em
seguida acusar os adversários, jogando neles a culpa pelo malfeito.
- Criar alianças
para espalhar mentiras e calúnias contra um inimigo em comum, para depois voltar
essas mesmas calúnias contra os antigos aliados.
- Aparecer
publicamente ao lado de líderes religiosos, de preferência com uma Bíblia
debaixo do braço (“o verdadeiro ornamento para se conhecer um homem santo”) e
citar versículos a torto e a direito, para dessa forma “cobrir a infâmia explícita
com farrapos das Sagradas Escrituras e ficar parecido com um santo quando se
está mais bancando o diabo.”
Tudo considerado,
não sei o que causa mais espanto, se é o fato de Shakespeare ter denunciado a
artimanha já há tanto tempo ou se é esse tipo de esse tipo de golpe fuleiro e
mal-ajambrado continuar funcionando tantos séculos depois. Só posso desejar que
o paralelismo entre a Literatura do passado e a Realidade de hoje siga até o
amargo fim, pois anseio por ouvir o brado fanhoso ecoando nas redes sociais: “Meu reino por um gado, tá ok?”
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FAVELA
GÓTICA liberado na íntegra no site da Verlidelas Editora:
https://www.verlidelas.com/product-page/favela-g%C3%B3tica
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esse período de pandemia, em meio a tantas incertezas, temos uma única
garantia: a de que nada será como antes. Estamos todos tendo a oportunidade
preciosa de participar ativamente na reconstrução de um mundo novo, mais
luminoso e solidário.
O
livro Favela Gótica fala justamente sobre “a monstruosidade essencial do
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tornamos mais conscientes das sombras que existem em nossa sociedade, seremos
mais capazes, assim como a protagonista Liana, de trilhar um caminho coletivo
das Trevas para a Luz.
A
versão física de Favela Gótica está à venda no site da Verlidelas, mas – na
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Book
trailer
Entrevista sobre o livro na
FM Cultura
Resenha (Perpétua):
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ResponderExcluirPassando para desejar boa noite
Beijos...
Tudo de bom, Cidália!
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