"O cadete e o capitão": importa ao Brasil atual
"Não
acredito numa única palavra, não lerei e não gostei".
Quem
se assume tomado por convicção diz isto, raríssimas
exceções destoam deste comportamento. Compreende-se. Não é, e nem
jamais deverá ser, um único livro a desvendar verdades por detrás
de um biombo empoeirado.
Pobre
daquele que possui único livro de cabeceira, muitos já disseram
isto. Nem
que seja
o livro mais sagrado de sua fé, pior ainda, há outras fé
afinal,
a sua nunca será a mais verdadeira, pois todo dogma, em um mundo
multidiverso, é contraditório por si só.
Ocorre
que pelo título tão somente não se pode inferir se a obra é
elogiosa ou não. Os leitores haverão de associar o livro ao que
ouvirem comentado, seja vindo do campo da esquerda quanto do campo da
direita.
Há
muito de elogio,
documentado, reconhecido, admitido, o protagonista teve passagens
significativamente positivas ao longo de sua carreira militar.
O autor apresenta vasta documentação, cópias autenticadas e várias
referências
e informações adicionais nas notas ao longo do texto. As notas que,
deliciosamente, podem ser facilmente acessadas na versão digital
ePUB.
O
premiado escritor de livros-reportagens, Luiz Maklouf Carvalho
publica em 2019 este título e em 2020 falece vítima de câncer.
Obra derradeira ao Brasil atual.
Obra
exemplar.
Jamais
um único texto ou um único autor pode se arvorar
a deter a verdade absoluta, um dogma portanto. Vale sempre a
comparação, estudo,
o que toma tempo, exige extrema organização e concatenação de
argumentos, tarefa nada fácil.
Mesmo
no interior de uma única obra, esta em questão, veja: “Não
terá sido isso que influenciou o Tribunal”, disse.
“Foi
justamente isso”, garanti.
“Não
me lembro”, disse Cataldo.
Ou
seja, todo e qualquer assunto que adquira um
mínimo de polêmica sempre
está,
esteve, e sempre estará sujeito a
dicotomias e reações,
contra-argumentos,
a depender do nível também sujeito
às teorias
de conspiração inúmeras.
Esta
obra de
Luiz Maklouf é o que se espera de uma reportagem
jornalística avessa às paixões.
Nada dentre título e capa infere sobre tomada de partido, idem ao
conteúdo. São alternadas descrições detalhadas de pareceres
contrários e favoráveis ao caráter e conduta do protagonista.
Toma
bastante tempo e trabalho, energia, chegar às conclusões nunca é
tarefa fácil, necessário comparar, sempre, constantemente favorecer
a dicotomia. Desta forma, no livro, e em qualquer assunto polêmico,
trata-se de exercer uma constante comparação.
Dá
trabalho. Exemplo: Revista semanal de circulação nacional intitula
capa afirmativa "Bolsonaro fez isto, há provas". Este
livro de Maklouf exibe tal citação, em seguida outra, referente ao
mesmíssimo assunto, em que um colegiado de várias pessoas atestam
"Não, não há provas".
Posteriormente este colegiado é
colocado em suspeição devido ao histórico dos membros e às
contradições de suas explanações em voto de plenária. Volta-se
ao argumento anterior, portanto há, ou no mínimo, podem haver
provas. Trabalheira do cão, jornalista não tem vida fácil não.
O
livro de Maklouf é cheio destas idas e vindas, mas com o esforço de
leitor que a obra merece é perfeitamente possível formar um corpo
lógico concatenado, separando as verdades das inverdades.
Leia-se
de peito aberto, sem paixões, com o exercício do livre-pensar.
Obra
recomendada e necessária ao Brasil atual.
Rogério Puerta, São Paulo, julho de 2022.
Gratidão pela bela e instigante resenha!
ResponderExcluir