Frio, cínico e cruel.
Esses, que podem ser os atributos de um bom espião, são também as principais qualidades desse livro, cujo mérito maior, penso eu, seja retratar a espionagem durante a guerra fria de forma bem “realista”, ainda que com toda a fantasia de um bom suspense.
Está certo que eu não entendo nada de espionagem (ou quase nada, salvo as fantásticas coisas que aprendi durante minha passagem pelo exército, que prefiro nem comentar...). Mas imagino que a espionagem “de verdade” tenha pouco a ver com os inocentes jogos entre cavalheiros que aparecem nos romances de Agatha Christie, e bem pouco igualmente do glamour e das fêmeas fatais que povoam as histórias do 007 de Ian Fleming. Gisele, a espiã nua que abalou Paris, então, ai de mim! Não deve passar de pura fantasia...
A espionagem na vida real deve ser mesmo é como num romance de John Le Carré: sórdida, confusa e cheia de burocracia...
Muito interessante é o personagem George Smiley, total antítese de James Bond: baixinho, gorducho e corno! E ainda assim provavelmente o melhor espião da literatura - não no sentido de ser o mais carismático, mas de ser o melhor mesmo no ofício de espião!
Pois o cara é bom mesmo, tanto que aparece nos principais livros do Le Carré. Finalmente tive a chance de ler uma história estrelada por ele. Aqui, Smiley precisa provar que é o melhor de todos, se deseja descobrir quem é a “toupeira” infiltrada no coração do Circus, a agência de espionagem britânica.
Em um certo aspecto, a história é também um romance policial clássico, pois cabe ao leitor descobrir junto com Smiley quem é o perigoso agente duplo. Mas a melhor parte não é descobrir o culpado, e sim acompanhar Smiley em sua penosa Odisseia mental para montar todo o quebra-cabeças.
John Le Carré é muito competente em seu ofício de contador de histórias de espionagem e dono de um estilo muito próprio, que começo a apreciar.
Alô tradução!
Um aprendizado a mais ficou por conta da tradução. A criatividade já fica evidente na tradução do título (“Tinker Tailor Soldier Spy” no original). Dois trechinhos me fizeram pensar.
Teve uma fala de Smiley, dizendo que fulano estava “caçando gansos selvagens”.
Essa expressão “wild goose chase” é bem utilizada, e significa algo como “caçar fantasmas”, no sentido de indicar uma tarefa árdua e com poucas chances de êxito.
A tradução literal dessa fala me fez pensar que o tradutor talvez estivesse meio distraído, sem render ao autor à merecida atenção que um texto tão sutil merece (tive a chance de ler um trecho dele em inglês, e senti a elegância do texto).
Mas tudo bem, essa passava, afinal em meio a tantas palavras em código, operação Bruxaria, operação Testemunho, sujeitos conhecidos unicamente como Control, Merlin, Karla... seria compreensível esse pequeno lapso.
O que não dá para entender é a cena que acontece antes dessa, quando fulano está falando ao telefone, e “pressionou o fone contra as nádegas, para garantir que seria ouvido” (ou algo assim, cito de cabeça)...
Só posso entender que o tradutor leu “cheeks” e levou logo para a maldade... ou então existe uma outra palavra em inglês que signifique igualmente “bochecha, face” e também “bunda, nádegas”!!! Será??? Adoraria descobrir... só mesmo lendo o original!
Mas que ficou estranho esse trecho, ficou!!! Cheguei a imaginar que o tal fulano espião tivesse desenvolvido um código secreto a base de puns!!!
Rarara!!!
(08.06.11)
Caro Fabio... dei de cara com a capa deste livro e já fui logo lendo sua resenha. Adquiri este livro porque indo à banca (quando ainda se vendiam bons livros em banca na década de 80) para comprar "Um espião que saiu do frio", que todos diziam que era um livro marcante, deparei-me com este.
ResponderExcluirComecei a lê-lo e o achei confuso demais no início - seria por conta da tradução? (Eu não tenho sua capacidade para ler no original e acho que nem tenho mais tanta vontade em aprender inglês quanto tenho para tocar um bom piano. Em minha escala de prioridades o piano ganha disparado, depois vem escrever um livro e bem lá no final ler na língua inglesa.)
Bom, voltando ao livro, aos poucos fui me acostumando à escrita e confesso que gostei demais do estilo no final das contas, nem sei bem o porquê hoje em dia, mas em minha mente John Le Carre ficou guardado no mesmo local que Morris West. Acho que foi por causa do início complicado do livro.
Agora código secreto a base de "puns" é de lascar rs.
Fabio e suas irreverências!
ResponderExcluirHahahahaha...
Gostaria que alguém que pudesse nos esclarecer isso, pois o Fabio me deixou encucado tbm =D
Hehehehehe...
Ah, quanto ao livro, parece ser tão bom quanto os outros dois de Le Carré que li.