sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O morro dos ventos uivantes

"[...] por isso, ele nunca saberá como eu o amo; e não é por ele ser bonito, Nelly, mas por ser mais parecido comigo do que eu própria. Seja qual for a matéria de que nossas almas são feitas, a minha e a dele são iguais, e a do Linton é tão diferentes delas como um raio de lua de um relâmpago, ou a geada do fogo." (O morro dos ventos uivantes, Emily Bronte)


Clássicos são clássicos, não adianta questionar. A diferença discutível  existe apenas em como estes ocupam o espaço a eles destinados: se somos nós que o posicionamos nesta categoria ou se a obra se impõe por caminhos alternativos as nossas escolhas. No primeiro caso, nem sempre o mundo concordará com nossa opinião, mas ainda assim distribuímos seu ideal ao máximo - sempre que possuímos uma oportunidade, pois acreditamos que todos deveriam conhecer aquilo que nos chamou tanta atenção. No segundo caso, geralmente é a opinião de todos em torno da obra que nos chama a atenção para lê-la. E foi assim que adicionei a minha lista a obra resenhada.
Inúmeras foram às vezes em que O morro dos ventos uivantes apareceu para mim como alternativa. E a escolha veio em parte pela minha personalidade, em parte pelos locais que me eram apresentadas as referencias. Do acesso que tenho a cultura norte americana, várias foram às vezes em que personagens de series, filmes, livros, citam a obra em questão como esplendor do mais impossível amor. Foi por percebê-la recorrente aos diálogos que me detinham a atenção que decidi conhecê-la. Gosto de saber sobre o que as pessoas falam, e como elas falam. Queria entender a referencia feita a obra com propriedade, para que pudesse dialogar com os contextos a que sou inserido constantemente. E foi assim que me entreguei à história.
Único romance da escritora Emily Bronte, a narrativa conta as desventuras amorosas de Heathcliff e Catherine Earnshaw e dos irmãos Linton. A começar pela linguagem, o romance traduz um dialogo temporal - o livro foi publicado em 1847 - mas que não prejudica em nada o entendimento contemporâneo. É interessante notar também como os comportamentos dos personagens refletem a época em que a história ocorre, justificando assim a submissão das mulheres na cultura patriarcalista - dentre outros comportamentos típicos da época.
Toda história começa com a chegada do Sr. Lockwood as terras da Granja dos Tordos - Morro dos ventos uivantes, ambientes em que se passa a trama. Curioso pelo relacionamento conflituoso com o proprietário do imóvel alugado (Headcliff), busca elementos que justifiquem o seu comportamento. Após cair adoentado, entra em contato direto com a governanta da residência por ele alugada, Ellen. Será esta que narrará a trajetória local ao visitante. Por conta disto, início e fim do romance ganham pouquíssima extensão e importância, já que serão as histórias narradas ao decorrer da mesma que apresentarão ao leitor a história de amor dos personagens Heathcliff e Catherine.
Quando criança, Heathcliff foi adotado pelo Sr. Earnshaw (pai de Catherine) em uma de suas viagens de negócio - não se delimita ao certo a origem do garoto. Por aparecer em um cenário familiar já construído, e, tendo de conquistar o espaço negado pelo primogênito da família (Hindley), a vida de Headcliff sempre foi marcada pela humilhação e descrédito, principalmente após a morte do seu protetor. As margens da família, separado da amiga Catharine e privado de toda educação possível, o menino cresce bruto (brutalizado), ignorante de todas as possibilidades da vida. Em busca de vingança, transforma sua vida para destruir a daqueles que se puseram em seu caminho. Enquanto luta pelo amor da amada e se vinga de seus malfeitores, escreve uma história marcada de péssimas escolhas.
Através de belas construções literárias, como a utilizada no inicio deste texto, a autora mostra como a tomada de decisões podem afetar com tamanha intensidade a vida dos envolvidos, atravessando gerações. Os caminhos tomados pelos personagens, carregados sempre das piores decisões colabora para a infelicidade dos mesmos na narrativa. A meu ver, são as escolhas ministradas diante das situações apresentadas que fazem com que a mais bela história de amor seja não mais que um desencontro de bons sentimentos. A vingança, o ciúme e a posse circundam a narrativa e conduzem ao fim da narrativa e do próprio personagem - que tomado pela repercussão de suas ações, beira a loucura.
Não foram poucas as vezes em que pensei em abandonar o livro, penso que foi um exercício de paciência, mas, para mim, a grande qualidade do livro esta justamente na questão. Apesar da vontade de abandoná-lo constantemente, a outra força exercida que nos impedi de deixá-lo é maior. Os personagens são construídos de forma que mantem ao menos tempo que simpatia, antipatia. Um equilíbrio dosado na narrativa.

Para outros textos e promoções, acesse: UM OLHAR SOBRE O TUDO E O NADA

Um comentário:

  1. Belíssima resenha. Eu li este livro há muitos anos, em uma daquelas adaptações juvenis. Sempre me pego pensando em ler uma edição decente.

    ResponderExcluir

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...