Sob
muitos aspectos, Anthony Burgess é o meu escritor favorito. A impressão que
tenho é que ele poderia facilmente escrever o livro que quisesse, qualquer
livro. Talvez por isso, tenha se dedicado a escrever livros que ninguém mais
poderia escrever, a não ser ele.
Minha
paixão por Burgess começou indiretamente, quando assisti pela primeira vez ao
filme “Laranja Mecânica”, dirigido por Stanley Kubrick. O filme me deixou de
boca aberta e babando. Corri atrás do livro que o havia inspirado, e é claro
que o livro era ainda melhor! Burgess conseguiu construir uma história
incrivelmente cínica sobre os chamados “tempos modernos” e, de quebra, inventou
um delicioso dialeto que mistura russo e cockney (gíria da classe trabalhadora
inglesa). Totalmente horrorshow, meus camaradas! Um verdadeiro alimento para a
gúliver. Pretendo reler em breve.
Outros
livros de Anthony Burgess que li:
AS
ÚLTIMAS NOTÍCIAS DO MUNDO – três histórias totalmente distintas sendo narradas
em paralelo: a invenção da psicanálise por Freud, um musical na Broadway sobre
Trotsky e a iminente destruição da Terra por um asteróide. Uma verdadeira
‘tour-de-force’ intelectual, absolutamente brilhante!
A
SINFONIA NAPOLEÃO – audacioso experimento literário: traduzir em forma de
romance a “Heróica”, Sinfonia Número 3 de Beethoven, dedicada e depois
‘desdedicada’ a Napoleão. Esquizofrenia genial e muito pouco indulgente com o
leitor. Acredito ter sido fortemente inspirada pelo “Ulisses” de James Joyce.
Ler esse livro foi uma experiência inigualável, a minha maior influência literária
até hoje. Durante cerca de três meses, ouvi a “Heróica” no talo uma média de 16
vezes seguidas por dia (sério!). Só parei quando o vizinho, em um justificado
ato de vingança, colocou para tocar no mais alto volume uma mesma música brega
durante toda uma tarde de sábado.
A
ÚLTIMA MISSÃO – debochada e bizarra história de espionagem, que gostaria de
reler.
ENDERBY
POR DENTRO – achei a história sem graça, um livro chato e insuportável. Isso da
primeira vez. Ao reler, achei genial, engraçadíssima e inspiradora!
Mas a
obra-prima de Burgess é, sem dúvida, “Poderes Terrenos”!
Livraaaaaaaaaaaaaaaço!!!!
“Era a
tarde do meu octogésimo primeiro aniversário e estava na cama com meu veado
quando Ali anunciou a visita do arcebispo.”
Em
minha opinião, essa é simplesmente a melhor frase de abertura da literatura
mundial!!!
E assim
somos apresentados a (frase da orelha do livro) “um dos personagens mais
encantadores que a literatura inglesa já produziu”: Kenneth Marchal Toomey,
escritor, octagenário, homossexual. Não necessariamente nessa ordem.
O
motivo da visita do arcebispo: ele quer que Toomey escreva um depoimento sobre
um suposto milagre que o escritor teria testemunhado há muitos anos. O objetivo
desse texto seria ajudar no processo de canonização do papa recentemente
falecido.
Toomey
decide fazer isso à sua maneira, contando a história de sua longa vida e ao
mesmo tempo a história do século XX. E assim somos arrebatados por uma aventura
intelectual sem precedentes. Personalidades e fatos históricos misturam-se com
a delirante imaginação de Burgess em um resultado de brilho incomparável.
Li
agora pela segunda vez essas impressionantes 604 páginas. Esse livro fala sobre
muitas coisas. Creio ter percebido, no virar da última página, as intenções
primordiais da obra. O ato de escrever um livro como reflexo do ato original da
criação do universo. Deus como Demiurgo. Os homens como personagens de um
romance. A questão da liberdade. Tudo sempre contado com um irônico sorriso nos
lábios.
Embora
a leitura seja intensa e divertida, não é exatamente um livro fácil. Há uma
profusão de frases nos mais diversos idiomas, e um senso de humor muito
específico, que mistura rudes zombarias com citações eruditas. Não é para
todos. Considero especialmente recomendável para escritores. Um dos melhores livros que li na vida.
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Aproveito para convidar você a conhecer o meu livro, O
SINCRONICÍDIO:
Booktrailler:
http://youtu.be/Umq25bFP1HI
Blog:
http://sincronicidio.blogspot.com/
LEIA AGORA (porque não existe outro momento):
Prezado Fábio, há alguma referência sobre a criação artística da capa de "A Sinfonia de Napoleão" (foto do post)? Encontrei uma concepção semelhante aqui: http://www.biblio.com/books/286149887.html
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