quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Aos pés de Ana Cristina Cesar



My dear

É tao difícil falar do que nos encanta e enleva... Não consigo explicar minha ternura. Minha ternura entende? E minha ternura e admiração por sua obra não posso dimensionar.  Meu primeiro contato com a obra de Ana Cristina Cesar, poeta, tradutora e principal nome da geração mimeógrafo na década de 70,  foi durante a graduação. Os fragmentos eram parte dos livros  A teus pés, Cenas de Abril e luvas de pelica.

Alguns anos depois, a vertigem que não passa e esse jazz do coração que continua a ressoar forte e ritmado fez-me escolher a mesma obra para objeto de estudo e pesquisa. Exatamente os três livros já citados. Esse contato mais aprofundado e cuidadoso com uma obra que, de forma genial mistura gêneros como diário, correspondência e poesia, fez aumentar ainda mais a admiração e o encantamento por essa literatura confessional de uma confissão impossível.

As cartas e o registro de acontecimentos cotidianos ( que não se explicitam totalmente) são apenas pretexto para a poesia. A realidade é encenada, como em um teatro. Não há detalhes sobre as pessoas a quem o emissor se dirige e nem sobre ele próprio. A intimidade é tanta que é indizível.
Uma escrita fragmentada, forte e incisiva como nenhuma outra deixa a cargo do leitor sentir aquilo que não se pode dizer. Entrar no sonho de alguém e interpretá-lo. Feminina e ao mesmo tempo cortante, acaba sendo reflexo de um período de censura onde as vozes foram caladas e era permitido apenas pensar. Li uma edição que continha os três livros em questão e neles, a impressão que se tem é a de estar viajando com Ana, ou vendo a vida passar pela janela de um trem, figura recorrente em seus textos.

Assim, é impossível ancorar uma navio no espaço. Impossível limitar e definir aquilo que transforma pequenos acontecimentos banais como o envio de uma carta, o aguardo de uma resposta,  uma coceira no hímen ou estar um desperdício de bonita em uma noite de natal, em poesia que fala por si só. My dear, o real é apenas uma desculpa.

Ágil e curta como sua própria vida, a obra de Ana Cristina Cesar permanece ecoando até hoje em meio a silencio e mudez. Os livros são curtos, a linguagem é agridoce, o sonho, impenetrável. Só é possível fingir. Entao, My dear, vamos ao teatro?

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