sábado, 22 de junho de 2019

QUEM TEM MEDO DA CIÊNCIA? – Isabelle Stengers



Li esse livro pela primeira vez aos 18 anos, quando cursava a Faculdade de Comunicação Social da UERJ. Foi uma leitura que me marcou profundamente. Tanto que de todos os livros que li no curso, guardei apenas esse e mais dois ou três para reler em algum momento do futuro. Mas foi só agora, durante a releitura, que pude apreciar realmente o quanto esse livro influenciou minha vida.

Graças a “Quem Tem Medo da Ciência?” adquiri um saudável ceticismo com relação ao que poderia ser chamado de “onisciência científica”. A ciência é, idealmente, um método de busca da Verdade a respeito do homem e da natureza. Contudo essa busca é influenciada por uma série de fatores que nada têm a ver com ciência: interesses políticos e financeiros, jogos de poder e muitas vezes, infelizmente, opiniões preconcebidas e dogmas por parte dos cientistas que conduzem as pesquisas.

Vou citar um único exemplo, dentre os tantos abordados durante os cinco dias de seminário no Colégio Internacional de Estudos Filosóficos Transdisciplinares, realizado em outubro de 1989 no Rio de Janeiro, que acabaram se transformando nesse livro. Stengers cita como foi importante para a biologia o advento da bactéria como uma “testemunha fidedigna”, que podia conferir o status de método científico ao seu estudo sistemático. Isso gerou o que a autora chama de “operação de captura”, fazendo com que toda a biologia fosse daí para a frente pautada pelos paradigmas ditados pela biologia celular, que era o segmento dedicado ao estudo das bactérias. E quais foram as consequências disso em outras áreas da biologia? A embriologia, por exemplo, ficou em cheque, pois nada no estudo da bactéria podia explicar o desenvolvimento embrionário (sabemos que depois da publicação do livro a embriologia teve a oportunidade de exercer, por sua vez, uma “operação de captura”, assumindo uma posição de destaque outrora ocupada pelo estudo das bactérias).

Já outro ramo da biologia, a etologia, que era diametralmente oposta à biologia celular, passou a despertar cada vez menos interesse, o que acarretou diminuição das verbas disponíveis para financiamento das pesquisas etc. Ora, a etologia é o estudo dos animais em seu habitat natural, nada mais distante do controlado estudo em laboratório das propriedades moleculares de uma célula. O despertar de um progressivo interesse pela biologia molecular acarretou uma decadência no estudo etológico.

Até aí foi o livro, mas me permito ir adiante: o que teria acontecido se a situação fosse ao contrário? Como teria avançado a ciência se o estudo in natura fosse considerado prioritário, recebendo todo interesse e todo financiamento? Talvez tivéssemos caminhado para uma apreciação mais precoce da importância da preservação da natureza para a continuidade da existência humana, e não estivéssemos à beira da extinção planetária por conta de inúmeros abusos cometidos contra o meio ambiente.

Isabelle Stengers nos ensina que a objetividade científica é muito superestimada, para dizer o mínimo. Todo fato é na verdade a interpretação de um fato. Não existe ciência pura, isolada de uma ideologia que a justifique e conduza. Isso não quer dizer que devamos execrar a ciência como algo maléfico ou não confiável (como muitos têm feito atualmente, de forma irracional e potencialmente autodestrutiva). Isso significa que devemos considerar a ciência um instrumento para o conhecimento da Verdade, dentre outros instrumentos igualmente válidos e complementares (como a espiritualidade e a arte), mas nunca como o único caminho, verdade e vida. A verdadeira Sabedoria não pode nascer da compartimentalização de saberes, mas da percepção holística que propicia a expansão da consciência.

Que assim seja!



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