Insanas... elas matam
Resenha de Tânia Souza
Assim que terminei de ler
Insanas, lembrei-me de quando a Editora Estronho lançou o convite para seleção
dos contos. A proposta? Uma antologia escrita somente por mãos femininas. Mãos
que escreveriam o aspecto mais cruel que a mente pudesse vislumbrar. O projeto
já me ganhou a partir desse momento. O regulamento deixava claro, os contos
deveriam ser escritos por autoras, mas nada obrigava que as personagens fossem
femininas, entretanto, as autoras aceitaram o desafio e nesta viagem, o
feminino/autora converteu-se/uniu-se, quase predominantemente, ao
feminino/personagem. Com exceção de alguns contos que trazem outros
protagonistas, são também femininas as mãos, dentes, gestos e mentes ferinos
que povoam e temperam com tinta sangue estas páginas.
Insanas, elas escrevem.
E insanas, elas criam vida em
cada conto.
Antes de falar sobre os contos,
não posso deixar de comentar como é bacana o trabalho de diagramação da Editora
Estronho. A capa é lindíssima! Como tenho costume de carregar um livro por onde
vou, interessante ver como as pessoas entortam o pescoço e vencem a timidez
para perguntar sobre o livro. Parabéns por mais esse belo trabalho.
A maioria dos contos me agradou
muito, com exceção de alguns, que apresentaram personagens de crueldade
extrema, mas com motivação fraca ou mesmo ausente. Como apreciadora dos gêneros
terror e horror, creio que a insanidade/crueldade no literário é bela,
principalmente quando bem contextualizada.
Mas como em toda antologia, a
diversidade é sempre um ponto a mais, para cada leitor, um ambiente, cenário ou
estilo apresenta diferentes sentidos. Do suspense ao gore, Insanas
causa efeitos, nunca indiferença: assusta, assombra; causa
estranhamento, pena e repulsa. Surpreende. Não vou comentar todos os
contos e
sim as narrativas que (por um motivo ou outro) mais me chamaram atenção.
Em “O Bem e o Mal” Sandra Franzoso apresenta, essencialmente, uma
protagonista descobrindo o prazer e o sabor da crueldade. O estilo escolhido
para a narrativa deste conto não me agradou, mas a alternância de
ferocidade/doçura/crueldade (extrema) da protagonista prende o leitor.
Em “A Última Oração”, de Tatiana Ruiz, no sombrio século XVIII, fé,
religiosidade, solidão e algo tão maligno que parece impossível de se deter são
alguns dos temperos dessa narrativa.
Este conto traz para o leitor,
diretamente “Do Inferno” a
oportunidade de conhecer, intimamente, a mente de um assassino. Quase cúmplice, o leitor acompanha devaneios,
motivações e ações de crueldade extrema de uma criatura complexa e cruel. Conto
de Georgette Silen.
A Fazenda, conto de Alma Kazur, desvenda segredos do sertão
pernambucano. Uma fazenda é palco para crueldade, pactos, magia, escravidão, passado
e presente, tortura, possessão. Não apenas um algoz, mas uma família inteira.
Celly Borges, em Vítimas, com uma narrativa enxuta e
ferina, apresenta a luta de jovens amigos pela vida. O mal empresta forma
humana, mas sua origem é bem mais antiga.
A Anita de Carolina Mancini é quase cativante em sua solidão e
complexidade. Quase. Sensual, confusa, insana, amaldiçoada? A cada cena a
protagonista revela uma face e nesse caminho de autoconhecimento, consciência e
aceitação, o mal ganha dimensões extremas.
Roberta Nunes, em o “Pecado Original”, apresenta uma sociedade
na qual o poder e o governo pertencem às mulheres. As convenções sociais deste
universo determinam que, de forma cruel, os pecadores paguem por seus crimes e,
quando livres, apenas façam o que devem fazer: servir. Conto diferenciado e com
final surpreendente.
Débora Moraes oferece: Quer uma Torrada? Curto, forte e cheio
de ritmo. O leitor mal terá tempo de aceitar a torrada. Mas vai ler bom
conto.
O conto de Alícia Azevedo, Memórias, é um dos meus favoritos. O
fervilhante Moulin Rouge tem um
cantinho especial neste conto, assim como outras cenas e personagens que
constroem sutis relações intertextuais. Sedução e crueldade mortal rondam os
passos da perigosa e cativante protagonista.
Creio que uma das características
mais interessantes nos contos de Insanas
é a dualidade, o mal incontrolável e de origem sobrenatural convive
pacificamente com a insanidade oriunda da própria mente humana. Entre as
motivações, traições, solidão, vingança, opressão. Mas também, apenas o prazer
de fazer e sentir o mal. E por este mal, a crueldade não tem limites.
Ao leitor, recomendo: não espere
por redenções ou sentimentos como a culpa. O prazer da insanidade é levado até
as últimas consequências nesse desfile sombrio, pois elas são transgressoras,
tristes, sensuais. Podem ser feias ou lindas. Assustadoras, apaixonadas ou
vingativas. São cientistas, crianças, bruxas, vampiras. Vítimas e assassinas. Criaturas
inomináveis... ou simplesmente insanas.
Baixe o arquivo para
degustação do conto "Tinta Vermelho Sangue", de Bruna
Caroline e conheça um pouco mais do universo de Insanas... elas matam
Confesso que odeio contos.....mas me apaixonei tanto pela capa que quero o livro pra mim....rs
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