quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Resenha - (In) visível Real [Pulp Ideias]

"A vida dos outros, tal como nos chega na chamada realidade, não é cinema mas sim fotografia, ou seja, não podemos apreender a ação, mas apenas seus fragmentos eleaticamente recortados. [...] dar coerência à série de fotos para que se tornassem cinema significava rechear com literatura, presunções, hipóteses e invenções os intervalos entre uma e outra foto". 

Neste trecho de O Jogo da Amarelinha, Morelli, um dos personagens criados por Julio Cortázar, afirmava que um livro deveria ser escrito como os desenhos que seguem as leis da Gestalt, ou seja, os traços apenas guiariam o observador a construir imaginativamente determinada figura e, "por vezes, os traços ausentes eram mais importantes, os que realmente contavam".

De certo modo, (In) visível Real sintetiza estas mesmas questões de visibilidade e invisibilidade. Hoje, o que resta do movimentos coreográficos de Luiz Arrieta e Dani Lima, da sonoridade das canções de Chico Buarque e Edu Lobo e da plasticidade dos cenários e figurinos de Rosa Magalhães em O Grande Circo Místico são estes pequenos contornos que chamamos de fotografia e que são incapazes de traduzir integralmente este espetáculo. Talvez, por isso, nunca tive a ambição de chamar este livro de documentário. Se algum termo precisar ser usado que seja inventário, que deixa de lado conceitos frágeis como a verdade, e traz à tona uma carga de afetividade e doação que me parecem mais apropriados.


Por fim, meu processo de selecionar, ordenar e editar as fotografias deste balé foi cinematograficamente cortaziano. Revirar os quase três mil negativos, os copiões, enfim, todas essas "sobras de tempo" me trouxeram lembranças, rostos e sensações que iam ligando uma imagem à outra e compondo um filme muito particular.


Para mim, nada aqui é espetáculo. Tudo dança. - Tom Lisboa


Dança e fotografias. Seria essa a combinação perfeita? Imagens que mais se parecem estar em movimento quando embalados por uma boa música. Simples, porém ousado. Uma ideia inovadora, especial. Pronta para ser degustada acompanhada de um bom vinho. 


A leveza de cada passo, cada sentimento que transborda e quase nos faz ir à loucura. Esperança em cada olhar, distinto, a cada braços e mãos entrelaçadas que ali se encontrar aparentam estar em êxtase, sem se importar com o que pensam, mas sim, pensam em satisfazer toda aquela plateia que anseia por arte. Por eles. O Tom soube como construir as imagens e uni-las às músicas, ora cantam imagens, ora pensam cantar músicas.


Imagens que parecem ser o começo, mas pode não ter fim. Gestos que falam mais que palavras. Sonhos se realizando em um só lugar, em etapas; curtem a cada segundo. Corpo e arte, ou melhor, corpo é arte. O que parece não fazer sentido no começo, acaba virando um quebra-cabeça a ser decifrado chegando ao fim. Imagens que comandam, mandam e desmandam, e obedecem à estímulos involuntariamente cogitados.


"Será que ela é moça. Será que ela é triste?" A música transparece alguns sentimentos esquecidos, que aos poucos se revelam. No ar, toda aquela leveza acaba de se tornar essencial para os nossos olhos, e quem responde é o coração. Bate tão forte que quase não se aguenta. 


Brincadeiras que refletem o ser; que falam por si. Palhaços. Com aquelas roupas belíssimas que encantam e cantam sem que possamos ouvir; jovens, adultos e quem mais não podemos ver. Sorrisos que escondem dor; rostos tristes, simulados, que ofuscam tudo que há de ruim e que não pertence àquele ambiente. Muita felicidade presente em inúmeros atos. Distintos. 


O corpo fala estando em pleno silêncio; jamais se cala. Caras e bocas que traduzem sentimentos; e a boca sem sequer soltar uma palavra. Um desespero temporário, em cada cena. Tudo passa. 


Entregues de corpo e alma. Todos em uma só sintonia. Lugar onde o medo não tem lugar. Corpos que juntos expressam vozes ocultas e te libertam da loucura. Pessoas que deixam de falar por si, e que agora seu corpo é que tem a voz. Sincronismo, um sinal de amor; e um amor que se derrete através do rítmo; uma viagem. Tudo parece utopia.


Chega ao final, aparentemente. Agradecimentos e a vida que segue, transformada e transformadora. Todos de pé, contentes e chorosos, esperando pela próxima viagem. Todos se reúnem, realizados pelo que fizeram e pelo que se tornaram. Um espetáculo, por fim, eterno.

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